Recebi valores de uma ação trabalhista. E o imposto de renda?

Imagine a Marina. Ela possui 24 anos de idade e nunca se preocupou com o imposto de renda. Afinal, ela não tem um grande patrimônio, só um Palio 2006. Desde os 21 anos ela trabalha no Supermercado Araguaia e foi promovida algumas vezes. Ela percebia em seu contracheque alguns descontos, como o desconto do I.R.P.F., mas nunca se preocupou com isso. Ela ouviu dizer, depois de sua última promoção, que deveria contratar um contador para fazer sua DIRPF – Declaração do Imposto de Renda da Pessoa Física e foi o que fez.

O problema é que o supermercado passou por uma grave crise financeira e Marina foi dispensada sem justa causa. Ela, então, ajuizou uma ação trabalhista visando o recebimento de salários em atraso, 13º salário, férias, horas extras não pagas, aviso prévio indenizado não recebido e multa de 40% do FGTS. A Marina, que foi surpreendida com sua demissão e passou a contar apenas com suas reservas financeiras e com o seguro desemprego (que demorou a sair!), viu sua ação tramitar por longos 12 meses na Justiça do Trabalho. Por fim, ela recebeu as verbas a que tinha direito! O advogado lhe entregou o resumo dos valores, as retenções das verbas remuneratórias foram efetuadas, porém a multa do FGTS não sofreu incidência, mas ela não ligou muito pra isso. Afinal, precisava tanto daquele dinheiro!

É bastante comum que o Reclamante ajuíze uma ação trabalhista visando o recebimento de verbas salariais (dentre outras) e ao obter êxito e receber a quantia devida, não se lembre do imposto de renda. Normalmente, a própria empresa efetuava os descontos necessários e, em muitos casos, a pessoa não tinha a obrigação legal de enviar a declaração. Então, levando em conta que a Justiça do Trabalho efetua as retenções necessárias das verbas remuneratórias, o Reclamante não imagina que deva declarar aquele valor recebido na justiça à Receita Federal.

Sobre as verbas indenizatórias, que no caso da Marina é o valor da multa de 40% do FGTS, não devem sofrer a retenção, pois não se trata exatamente de um ganho, mas de uma compensação por algum prejuízo. Portanto, este tipo de verba – com o intuito de indenizar – não deve sofrer a incidência do imposto.

Ocorre que o banco ao receber o depósito e repassá-lo ao Reclamante informa esta operação à Receita Federal. De fato, o imposto devido foi retido pela Justiça do Trabalho e repassado à Receita Federal. Porém, caso se trate de valor superior a R$ 22.847,77 (este valor pode ser alterado pela legislação em cada ano), ele deve ser declarado pelo Reclamante em sua DIRPF.

Caso a declaração não seja feita, a Receita Federal identificará sua ausência (porque o banco a informou que repassou determinada quantia à pessoa) e poderá suspender o CPF do Reclamante. Além disto, quando enviar a declaração, o Reclamante deverá pagar multa por atraso (que varia de R$ 165,74 até 20% do imposto devido).

A Marina, por não ter enviado a declaração, teve seu CPF suspenso. Porém, ela só percebeu isso quando foi na Farmácia Popular receber o medicamento que pega todo mês e foi informada da sua situação. Isto aconteceu com a Marina, mas poderia ter acontecido com qualquer pessoa em diversas ocasiões da vida comum. O CPF suspenso (ou “pendente de regularização”) implica em dificuldade de emissão de passaporte e certidões para a venda de imóvel, impede a nomeação em concursos públicos e a obtenção de financiamentos, dentre diversas outras consequências.

Todo este transtorno seria evitado se a Marina houvesse simplesmente enviado a DIRPF. Como a Justiça Trabalhista efetua as retenções necessárias, ela não teria que pagar mais nada, já estava tudo pago.

Inclusive, a própria Marina poderia ter enviado sua declaração, afinal ela não possui mais nada exceto este recebimento e seu Palio 2006. Bastaria que ela baixasse o programa no site da Receita Federal e seguisse as instruções contidas no próprio site e no programa. Ela deveria prestar atenção especial onde deveria inserir os dados dos valores recebidos na Justiça do Trabalho.

Estes não se tratam de valores isentos, mas valores tributáveis. A Justiça do Trabalho já efetuou o pagamento do imposto devido e inseriu todos os dados no processo. Então, basta copiá-los para a ficha “Rendimentos Recebidos Acumuladamente”. No campo Rendimentos Recebidos, deve ser declarado o valor do principal. No campo Contribuição Previdenciária Oficial deve ser informado o valor do INSS, se for o caso.

É necessário, portanto, que os Reclamantes sejam orientados sobre a DIRPF e se atentem à necessidade (ou não) de enviá-la em cada caso concreto.

Aline Guiotti (advogada tributarista) e Bruna Sanches (advogada trabalhista).

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